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Professor Fábio Cantizano, especialista em marketing para o mercado fitness.
Fabio Cantizano CREF: 16603-G/RJ – Profissional de Ed. Física.

Um estudo desafia a sabedoria convencional do treino com pesos.

Por anos, o consenso no mundo do fitness ditou que levantar cargas pesadas – mais de 70% da sua força máxima (1RM) – era o único caminho para construir músculos e força ideais.

Essa crença se baseia no princípio de que apenas pesos altos recrutam as unidades motoras de alto limiar (fibras musculares de contração rápida), essenciais para o crescimento.

No entanto, essa abordagem tradicional pode ser impraticável para muitos, como atletas em recuperação de lesões ou idosos com problemas nas articulações. Diante disso, o treino de baixa carga (LL-RET) emergiu como uma alternativa promissora. Mas será que treinar com pesos leves, realizando mais repetições, pode realmente se equiparar aos resultados do treino de alta carga (HL-RET) em quem já tem experiência?

Um estudo recente de Cumming et al. (2025) investigou exatamente essa questão, comparando as adaptações musculares e celulares de nove semanas de treino de baixa carga (20-25 repetições) versus alta carga (3-5 repetições), em indivíduos já treinados. A descoberta mais impactante: para hipertrofia e ganhos de força em exercícios complexos, ambos os métodos parecem ser igualmente eficazes.


O Design do Estudo: Treino Até a Falha e Cargas Iguais

Como os pesquisadores compararam os dois caminhos.

O estudo adotou um design intra-sujeito, minimizando a variabilidade biológica ao fazer com que cada participante treine uma perna com alta carga (HL-RET) e a outra com baixa carga (LL-RET).

Isso garantiu que fatores como dieta, sono e genética afetassem ambas as pernas de forma semelhante. Os 14 participantes, homens e mulheres já experientes em treinamento de força (com média de 26 anos), realizaram duas sessões semanais por nove semanas, focadas em Leg Press (exercício multiarticular) e Extensão de Perna (exercício monoarticular).

Crucialmente, todos os sets foram realizados até a falha volitiva. A falha volitiva significa continuar a série até o ponto em que não se consegue completar outra repetição com a técnica correta.

Embora o volume total de carga levantada tenha sido muito maior no grupo de baixa carga (2,5 a 4 vezes maior), esse método de treinar até a falha assegura que ambas as pernas tenham recebido um estímulo máximo para a adaptação.


Hipertrofia: A Regra do “Muitos Caminhos Levam a Roma”

Cargas leves e pesadas proporcionam o mesmo ganho de massa muscular.

Os resultados foram claros: o aumento na espessura muscular (uma medida de hipertrofia avaliada por ultrassom) foi semelhante entre as pernas, independentemente do protocolo. A espessura muscular aumentou em média 7% a 8% tanto na parte média quanto na distal da coxa.

Essa descoberta reforça a ideia de que o crescimento muscular, ou hipertrofia, pode ser alcançado com sucesso através de uma ampla gama de repetições, desde que o esforço seja alto e as séries cheguem à falha. O ditado “Muitos caminhos levam a Roma” resume a flexibilidade do músculo esquelético para se adaptar a estressores de treino variados, mesmo em indivíduos já bem condicionados.

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Adaptações Celulares: A Resposta Misteriosa

Apesar do aumento na espessura muscular (hipertrofia bruta), o estudo não observou mudanças detectáveis no tamanho das fibras musculares (fCSA) em nível celular. Essa discrepância sugere que a ultrassonografia (que mede o músculo inteiro) capturou um aumento de tamanho que a biópsia (que mede as fibras individuais) não conseguiu ver. Isso pode ser devido à variabilidade inerente à coleta de biópsias.

Curiosamente, o conteúdo de células satélites (células precursoras de novas fibras musculares) aumentou em 25% nas fibras do tipo I (fibras de contração lenta) em ambas as condições, sendo um efeito independente da carga. Isso implica que o esforço alto em si, seja com carga leve ou pesada, é o gatilho para a expansão do pool de células satélites.


Força Máxima: Onde a Especificidade do Treino Conta

O treino pesado ainda é superior para movimentos isolados.

Enquanto os resultados da hipertrofia se equipararam, a força máxima (1RM) revelou uma distinção crucial entre os protocolos.

  • Leg Press (Movimento Multiarticular):
    Os ganhos de força foram comparáveis em ambas as pernas, com um aumento médio de 21% na força. Isso indica que, para exercícios que envolvem múltiplas articulações (como agachamentos, deadlifts e o Leg Press), o treino de baixa carga até a falha é uma alternativa eficaz para aumentar a força máxima, desafiando a noção de que apenas cargas pesadas funcionam.
  • Extensão de Perna (Movimento Monoarticular):
    A perna que treinou com alta carga (HL-RET) foi superior, apresentando um aumento significativo na força (9% de aumento), enquanto a perna de baixa carga não mostrou alteração significativa.

Este achado sugere que, para movimentos mais isolados (como extensões de perna e rosca bíceps), a especificidade da tarefa (levantar pesado) é mais importante para a adaptação neural e o ganho de força.


Implicações Práticas: Como Aplicar a Ciência ao Seu Treino

Treine para a força ou para o volume.

Este estudo oferece informações valiosas para quem busca otimizar o treino. Se o seu objetivo é a hipertrofia, você tem uma flexibilidade muito maior do que se imaginava. O mais importante é o esforço – levar as séries até a falha.

  1. Hipertrofia é Flexível: Se você não pode levantar cargas pesadas devido a dores articulares ou lesões, o treino de baixa carga (20-25 repetições) até a falha é uma estratégia totalmente eficaz para construir massa muscular.
  2. Força em Movimentos Complexos: Para exercícios fundamentais multiarticulares, o treino de baixa carga até a falha pode gerar ganhos de força semelhantes aos do treino pesado. Isso é excelente para períodos de manutenção da força com foco na prevenção de lesões.
  3. Priorize o Pesado em Movimentos Isolados (Se for o seu foco): Se o seu objetivo é aumentar a força máxima em exercícios monoarticulares, a alta carga continua sendo a estratégia superior.

Em resumo, o treino de baixa carga até a falha é um substituto viável do treino de alta carga para hipertrofia e força em exercícios complexos. A chave não é apenas o peso na barra, mas a intensidade do esforço.


Recomendações Práticas

Estratégias de treino baseadas no esforço máximo

Para Foco em Hipertrofia (Crescimento Muscular)

  • Não se prenda ao peso: Use qualquer carga que permita atingir a falha muscular volitiva (onde você não consegue completar a próxima repetição com a forma correta).
  • Amplitude de Repetições Ampla: Use faixas de 3 a 5 repetições (alta carga) ou 20 a 25 repetições (baixa carga). Ambas são igualmente eficazes se realizadas com esforço máximo.
  • Benefício para as Articulações: Se você tem dores ou lesões, use cargas leves para maximizar o crescimento muscular com menos estresse mecânico nas articulações.

Para Foco em Força Máxima

  • Movimentos Multiarticulares (Ex.: Leg Press, Agachamento): Você pode obter ganhos de força comparáveis com cargas baixas (20-25 repetições) ou cargas altas (3-5 repetições), desde que o esforço seja máximo.
  • Movimentos Monoarticulares (Ex.: Extensão de Perna, Rosca Bíceps): Para maximizar a força neste tipo de exercício, o protocolo de alta carga (3-5 repetições) é superior e deve ser priorizado.
  • A Chave é o Esforço: A falha volitiva é o denominador comum que leva à adaptação, independentemente da carga.

Referência Científica Completa

Cumming, K. T., Elvatun, I. C., Kalenius, R., Divljak, G., Raastad, T., Psilander, N., & Horwath, O. (2025). Divergent strength gains but similar hypertrophy after low-load and high-load resistance exercise training in trained individuals: many roads lead to Rome. Journal of Applied Physiology, 139(4), 685–697.